segunda-feira, 23 de maio de 2011

XIII

Não venho aqui muitas vezes. Aliás, venho aqui muito poucas vezes. Há sempre mais qualquer coisa que acontece… o pensamento segue o seu abrir janelas por costume e a brisa vai-me levando esta cena da escrita de volta para a imaginação. É verdade, fica aquele vento leve na face, aquela cena agradável de sentir que, dentro, o pensamento cria um puzzle cá de fora e que há uma troca de sorrisos quando a coisa corre bem.


A escrita também é um ritmo do pensamento, digo de mim para mim, e vai-se trabalhando mesmo nos espaços de intervalo. E assim, de cada vez que chego aqui, leio isto tudo outra vez e depois é como um esperar que a brisa se acumule e gere um vento enorme a dar melodia aos ritmos. Esperar que é como quem diz… instalar-se no ritmo.

O ritmo, pois é.

Hoje fui almoçar com a minha turma da primária. Passados 23 anos, a Sofia lembrou-se que ia ser fixe se nos encontrássemos todos. Andou aí feita louca e arranjou o contacto de meio mundo e marcou-se a cena e lá fomos. E eu há anos que não via estas pessoas, e algumas estão casadas e com filhos e com vidas que foram construindo neste tempo todo… é sempre um cliché dizer que é como se não tivesse passado tempo nenhum e é mentira, porque passaram 23 anos, mas, durante quatro anos, passámos por tanta coisa juntos que…

Andava para vir aqui falar de ritmo há tanto tempo e sempre, aquela intermitência que me espaça a escrita vinha dizer-me ainda não. E agora chego aqui e acho que foi isso. Aquela turma foi um diálogo de quatro anos que deixou um ritmo nas pessoas, como na música ou como na escrita, e às tantas chegámos ali e não foi preciso muito para pegar nele outra vez, um pouco como estes textos que releio antes de continuar a escrever.

Tenho cantado, insistente e repetidamente, a música coral de Fernando Lopes-Graça e, a partir de certa altura, dou-me conta de que cada vez que canto, há uma troca mais intensa, cada vez mais um seguir no ritmo e no poema que as notas levam e nas emoções todas que afloram no durante… quanto mais sei as peças de cor, menos sei o que vai acontecer antes de as começar a cantar.

O ritmo, pois é, e as intermitências.

E há coisas mágicas nisto tudo, estes retomares de ritmos e de trocas… há quem se sente todos os dias da mesma maneira no mesmo automóvel e siga no mesmo caminho para a mesma sala de sempre a fazer o seu mesmo de sempre, a vidinha… e depois há quem olhe e absorva a paisagem e troque com todos os passos a surpresa atenta de poder andar.

O ritmo e as intermitências…

Somos muito criativos com as memórias, eu sei, e a mesma água não passa duas vezes debaixo da mesma ponte, mas hoje foi como nas músicas. Hoje, foi a troca dos sorrisos no pensamento, já não entre um dentro e um fora, mas como num eco que houvesse entre dentros, um ritmo conjunto.

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