domingo, 5 de junho de 2011

XIV

Porque nos repetimos ininterruptamente. Nem dava para ser de outra forma. E depois, há quem escolha o que quer repetir e depois há quem escolha essas repetições. Ou às vezes não.


Todos os dias entro no comboio, sento-me, ponho música, vou cantarolando e olhando a paisagem, com a máquina ou o livro ou as aulas por preparar…

Acho que no fim é isto:  a cena do poeta, da «gente atrasada para apanhar o elétrico que afinal ainda lá estava, apitando estridentemente»... É algo estranho que haja gente a tentar não perder de vista o ser gente, por um lado, e outra que tenta perder-se só para não se ver.

Continuo a cantar. Fico a pensar no Lopes Graça e na música dele e nesta gente que sai de manhã e entra à noite e pelo meio… o que cantarão?

Cruzo-me com todas estas pessoas que não conheço todos os dias, para lá e para cá no mesmo comboio e olho a paisagem e volto a para as pessoas e…
A repetição é criativa, ou às vezes não.

Eu não sei se se vêem chegar e partir, se se pensam naquilo que repetem, … talvez não lhes sobre tempo, ou talvez a imaginação esteja presa a tentar uma realidade melhor do que aquela…

O Gene Smith passou uns tempos a fotografar da janela em Manhattan, deslumbrado com a vida da rua quando lá chegou, e chamou a esse trabalho “As from my window I sometimes glance”. O trabalho é uma espécie de retratar das fugas da imaginação de alguém que tenta trabalhar com uma janela com vista para um mundo onde acabou de chegar e uma máquina por perto.

E o contraste das janelas faz-me perguntar
E no meio disto tudo, o que nos faz querer repetir?

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