sábado, 17 de janeiro de 2015

Roundabout I

Intriga-me esta ideia do Lugar e do Não Lugar, como Augé os descreveu. Dizer que o lugar é identitário, relacional e histórico e, por contraposição, que o não lugar é não identitário, não relacional e não histórico.
Augé descreve os não lugares como os aeroportos, os locais de grande consumo, as autoestradas, o ciberespaço ou os transportes. Talvez sejam exactamente aqueles que melhor serviriam para descrever o nosso tempo, a tal sobremodernidade, usando um termo seu. Nessa sobermodernidade, nos seus espaços, nos seus não lugares, passamos a maior parte do nosso tempo e da nossa atenção. A viagem de Pierre Dupond, com que Augé abre o livro, descreve um processo pelo qual passamos boa parte do nosso tempo. Já não apenas em viagem, ou nas lojas duty free, mas em practicamente todo o comércio e em practicamente todos os serviços. É necessária uma certa indiferença para que as coisas corram desta forma. Lembra-me a forma desafectada com que os motoristas dos autocarros cumprimentavam os passageiros à entrada, em Paris, ou da forma como somos atendidos, sempre com um sorriso e um Bom dia, em que posso ajudá-lo? perfeitamente pavloviano.

Com o crescimento desses não lugares, cresce também uma forma de estar que implica o atravessamento desses espaços e a atitude de desinteresse e da atenção focada noutro ponto. Tornamos todas as trocas e todas as incumbências da vida do dia a dia muito mais simples, libertamo-nos do peso que essa vida do dia a dia acarreta para podermos ter tempo para o que realmente interessa - nós; a nossa liberdade de escolher o que queremos fazer - mas, de repente, damo-nos conta de que há um problema: nós somos definidos pelos hábitos que assumimos e, ao passar o dia a dia nesse modo de "atravessar desinteressado", ao permitir que a nossa atenção vagueie a maior parte do tempo, estamos a tornar-nos estranhos à nossa presença no espaço; estranhos à experiência do nosso corpo no espaço que atravessamos.

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